segunda-feira, 17 de agosto de 2015

Até quando? Meninos do Trem, o pesadelo continua


Quatro adolescentes com idade entre 13 e 16 anos que viajavam de forma clandestina no trem cargueiro da Vale S/A foram localizados no pátio de manobras da mineradora em Açailândia. 

Os adolescentes haviam embarcado em Marabá, e só foram encontrados, porque resolveram desembarcar em Açailândia por conta própria, já que um deles estava gravemente feridos após sofrer queimaduras de segundo grau enquanto dormia em uma rede armada por eles próximo ao motor da locomotiva. 

Adolescente que sofreu queimaduras de segundo grau é encontrado em estado grave e encaminhado para hospital da região. 

O fato veio a público, depois que a ONG JUSTIÇA NOS TRILHOS denunciou o fato em seu site e emitiu NOTA PÚBLICA sobre mais uma grave violação de diretos humanos de crianças e adolescentes protagonizado pela mineradora Vale S/A. 

Parece mentira, mas há pelo menos vinte anos que o transporte irregular de crianças e adolescentes nos trens da Estrada de Ferro Carajás (EFC), operada pela VALE S/A, é denunciado pelos moradores das localidades cortadas pela ferrovia. ENTENDA O CASO - Dez anos depois a VALE ainda não solucionou o caso dos "meninos do trem"

No ano de 2005, a 1ª Promotoria de Justiça da Infância e Juventude de São Luís instaurou um Procedimento Administrativo, que continua em tramitação até hoje. No Pará, o Ministério Público também investiga o problema, tendo realizado uma audiência pública no dia 25 de fevereiro deste ano, no município de Marabá, que contou com a presença dos promotores de justiça Márcio Thadeu Silva Marques (1ª Promotoria da Infância e Juventude de São Luís) e Lúcio Leonardo Froz Gomes (2ª Promotoria de Justiça de Santa Luzia).

Paralelamente, a Promotoria de Justiça de Santa Luzia ingressou com uma Ação Civil Pública, em 2011, sobre o mesmo tema. Em medida liminar, a Justiça determinou que a empresa não permitisse o embarque de crianças e adolescentes em seus trens de passageiros sem autorização judicial ou autorização dos pais ou responsáveis, além de aumentar a fiscalização para impedir o embarque clandestino em toda a linha férrea.

Posteriormente, em um acordo judicial, a Vale se comprometeu a elaborar um Plano de Segurança e arcar com os custos para a contratação de um especialista indicado pelo MPMA, que faria uma análise crítica desse plano. O acordo proposto agora se baseia, justamente, no laudo elaborado pelo especialista canadense James Bertrand, que percorreu toda a extensão da Estrada de Ferro Carajás, acompanhado pela equipe do Ministério Público, no período de 8 a 21 de fevereiro de 2014.

Em uma audiência de conciliação realizada em 12 de junho de 2015, a Vale apresentou uma nova postura e iniciou um processo de diálogo com os Ministérios Públicos dos dois estados, propondo-se a discutir um acordo, que ao final veio a ser assinado no último dia 15 de junho e homologado no dia 30 do mesmo mês.

Ocorre que a nova postura da empresa veio acompanhada de uma série de imposições baseadas em justificativas financeiras e técnicas para não adotar as eficazes medidas que tinham sido propostas pelo engenheiro canadense e adotadas como necessárias pelos Ministérios Públicos do Maranhão e do Pará.

Dentre as recomendações do Dr. Bertrand está a identificação dos assim chamados “pontos quentes”: os trechos da EFC em que os trens param ou viajam a uma velocidade inferior a 20 Km/h, sendo esses os pontos de potencial embarque e desembarque das crianças e adolescentes.

Infelizmente, embora sejam mais de cinquenta os pátios de estacionamento ao longo da ferrovia, onde os trens param e deixam passar outros viajando no sentido oposto, a Vale dispôs-se a adotar sistemas de monitoramento em apenas três pontos da EFC (Marabá, Açailândia e São Luís), deixando descobertos mais de 70% da ferrovia e se negando a revelar o resto dos “pontos quentes”. Nessas outras localidades, em tese, o monitoramento será feito apenas por rondas realizadas pelos funcionários da empresa.

Dentre outros procedimentos recomendados pelo perito canadense, estavam a instalação detectores de calor, torres de observação e iluminação adequada em toda a EFC. A Vale S.A. não se comprometeu com nenhuma das recomendações e estabeleceu prazos longínquos para um problema que continua a acontecer com grande frequência, expondo a vida de crianças e adolescentes ao risco. E que tende aumentar com o aumento do tráfego de trens após a conclusão das obras de duplicação da EFC.


Nota pública da rede Justiça nos Trilhos¹

Meninos do Trem: mais uma vez a Vale decepciona





Nos estados do Pará e Maranhão, há pelo menos duas décadas, ocorre o fenômeno que ficou conhecido como “Meninos do Trem”. Ao longo da Estrada de Ferro Carajás (EFC) crianças e adolescentes embarcam clandestinamente nos vagões de minério da empresa Vale S.A. para se deslocarem entre as cidades dos estados do Pará e do Maranhão, colocando suas vidas e saúde em risco.

A facilidade encontrada pela falta de segurança e monitoramento adequado é o principal motivo para a realização dessas viagens. Essa foi a conclusão do engenheiro ferroviário canadense James Bertrand, após inspeção in loco ao longo da EFC, no período de 8 a 21/2/2014, e depois de uma análise crítica do Plano de Segurança da Vale. Portanto, ao contrário do que afirma a empresa Vale S.A., as viagens clandestinas de crianças e adolescentes não decorrem de problemas sociais, mas da fragilidade do sistema de segurança da ferrovia. E há soluções técnicas para preveni-las, ou ao menos reduzi-las bastante.

A realização dessa perícia pelo engenheiro canadense foi determinada pela juíza da 2ª. Vara Judicial da comarca de Santa Luzia-MA, onde tramita o processo nº. 157-60.2011.8.10.0057, que objetiva determinar que a Vale S.A. adote medidas de segurança eficazes para impedir ou dificultar o embarque de crianças e adolescentes nos vagões de trens de minério e de passageiro ao longo da EFC.

Durante anos, a mineradora negou ter responsabilidade e, inclusive, dificultou a realização da inspeção, tentou impedir a realização de uma audiência pública sobre o tema (Marabá-PA, 25 de fevereiro de 2015) e se negou por várias vezes a negociar com os Ministérios Públicos do Maranhão e do Pará uma possível solução consensuada para o problema.

Entretanto, com a designação de uma audiência de conciliação para o dia 12 de junho de 2015, a Vale apresentou uma nova postura e iniciou um processo de diálogo com os Ministérios Públicos dos dois estados, propondo-se a discutir um acordo, que ao final veio a ser assinado no último dia 15 de junho e homologado no dia 30 do mesmo mês.

Ocorre que a nova postura da empresa veio acompanhada de uma série de imposições baseadas em justificativas financeiras e técnicas para não adotar as eficazes medidas que tinham sido propostas pelo engenheiro canadense e adotadas como necessárias pelos Ministérios Públicos do Maranhão e do Pará.

Dentre as recomendações do Dr. Bertrand está a identificação dos assim chamados “pontos quentes”: os trechos da EFC em que os trens param ou viajam a uma velocidade inferior a 20 Km/h, sendo esses os pontos de potencial embarque e desembarque das crianças e adolescentes.

Infelizmente, embora sejam mais de cinquenta os pátios de estacionamento ao longo da ferrovia, onde os trens param e deixam passar outros viajando no sentido oposto, a Vale dispôs-se a adotar sistemas de monitoramento em apenas três pontos da EFC (Marabá, Açailândia e São Luís), deixando descobertos mais de 70% da ferrovia e se negando a revelar o resto dos “pontos quentes”. Nessas outras localidades, em tese, o monitoramento será feito apenas por rondas realizadas pelos funcionários da empresa.

Dentre outros procedimentos recomendados pelo perito canadense, estavam a instalação detectores de calor, torres de observação e iluminação adequada em toda a EFC. A Vale S.A. não se comprometeu com nenhuma das recomendações e estabeleceu prazos longínquos para um problema que continua a acontecer com grande frequência, expondo a vida de crianças e adolescentes ao risco. E que tende aumentar com o aumento do tráfego de trens após a conclusão das obras de duplicação da EFC.

A rede Justiça nos Trilhos vem acompanhando esse processo há mais de seis anos, articulando pessoas, entidades e movimentos da sociedade civil organizada e contribuindo a reportagens de denúncia, à organização de audiências públicas e à busca de soluções definitivas.

JnT reconhece o importante papel do Ministério Público no esforço dedicado há anos à questão. Entretanto, discorda do conteúdo final do acordo, considerando que a Vale não assumiu todas as suas responsabilidades, não ofereceu uma solução suficiente ao problema e, assim, faltou com respeito às instituições, à sociedade que se organizou para lidar com o problema e, sobretudo, às crianças e adolescentes vítimas de seu descaso e ganância.
São Luís, 12 de agosto de 2015.

¹Justiça nos Trilhos (JnT) é uma coalizão de lideranças comunitárias, movimentos sociais e pastorais, sindicatos e grupos de pesquisa universitária empenhados em defesa das comunidades atingidas por violações de direitos por parte da empresa Vale S.A. e as operações de mineração e siderurgia ao longo do corredor de Carajás, nos estados brasileiros de Pará e Maranhão. Cf. www.justicanostrilhos.org

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