segunda-feira, 22 de agosto de 2016

Pelo fim da cultura do estupro


"Segundo os códigos sociais vigentes sob o domínio patriarcal, em todas as classes – inclusive nas mais favorecidas –, homens não são ensinados a não estuprar, enquanto as mulheres são ensinadas a não serem estupradas. E se não “aprendem”, vivem sob censura, ameaça e constrangimento. Sobre ela recairá a culpa pela sedução que levou ao ato não consentido, ficando, implicitamente, o estuprador autorizado a voltar a estuprar, num círculo que se repete e se repete. A responsabilidade será sempre da vítima."




Por Hildo Rocha
A violência sexual disseminou-se no País, enquanto subproduto da violência sistemática contra a mulher, por sua vez alimentada e retroalimentada pela histórica desigualdade de gêneros. 

Segundo os códigos sociais vigentes sob o domínio patriarcal, em todas as classes – inclusive nas mais favorecidas –, homens não são ensinados a não estuprar, enquanto as mulheres são ensinadas a não serem estupradas. E se não “aprendem”, vivem sob censura, ameaça e constrangimento. Sobre ela recairá a culpa pela sedução que levou ao ato não consentido, ficando, implicitamente, o estuprador autorizado a voltar a estuprar, num círculo que se repete e se repete. A responsabilidade será sempre da vítima.

Trata-se de uma perversa subversão de valores historicamente chancelada pelo senso comum, com a corroboração da autoridade, às vezes, até, da família. Vale dizer: mesmo os que são, moral ou institucionalmente, incumbidos de dar proteção, acolher e ajudar, pôr-se, enfim, ao lado da vítima a desacreditam como tal. Lavam as mãos, e não se fala mais nisso. 

Estima-se que as queixas formais, com registros feitos por Boletim de Ocorrência, o conhecido BO, representem nada além do que 35% dos casos. A subnotificação, portanto, falseia a realidade em 65%. Não bastante, as notificações sofrem a filtragem dos inquéritos, ainda na fase policial, na qual mais de 70% dos BOs acabam arquivados. Segundo dados do 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, em 2014, 47.600 pessoas foram estupradas no Brasil. A cada 11 minutos alguém sofreu essa violência.

Não mencionarei mais uma vez as velhas razões, mas, a estas, gostaria de acrescentar fatores de ordem sociocultural, em face de um sistema de conduta em tudo permissivo. Esse sistema enfatiza o prazer, a transgressão, a sexualidade precoce e a superexposição nas redes sociais, em cujo ambiente, para o bem e para mal – no caso, para o mal –, surgem novos costumes – no caso, costumes que degradam e desumanizam. Juntem-se a isso a disseminação das drogas e, por último, nessa cadeia maligna, a impunidade.

Na preocupação da proteção à vítima, gostaria de destacar projeto de minha autoria que tramita na Câmara dos Deputados, com juridicidade, constitucionalidade e técnica legislativa aprovadas pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Trata-se do Projeto de Lei 215/2015 que tem por objetivo punir com mais rigor os crimes contra a honra praticados nas redes sociais. A minha preocupação como legislador é a proteção da vítima de estupro contra sua exposição indevida nas redes sociais, muito comum nos dias atuais.

E, nesse campo, com a intenção do fortalecimento da prevenção pelo aumento do acesso à informação, que estamos propondo a criação de uma base de dados, o Cadastro Nacional de Pessoas Condenadas por Crimes de Estupro, com dados relativos às pessoas condenadas por estupro. Falo do Projeto de Lei 5618/2016, que tramita na Câmara dos Deputados, com o objetivo de prevenir esse tipo de crime

A sociedade brasileira está mergulhada em violência. Falar isso mais uma vez pode parecer exaustivo. Mas é inevitável. Não queremos, não devemos, não podemos nos calar, devemos, sim, agir no sentido de evitar ou, pelo menos, diminuir esses crimes aperfeiçoando a nossa legislação.

Que as nossas vozes tenham a ressonância que o tema requer!

Hildo Rocha é deputado federal e Vice-Líder do PMDB na Câmara dos Deputados

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