Inelegíveis, mas com o mandato a salvo





A validade da Ficha Limpa fechou as portas das eleições para políticos condenados ou que tenham renunciado, mas não previu a cassação de quem já exerce o cargo
A confirmação de que a Lei da Ficha Limpa valerá nas eleições de 2012 significa não apenas a inelegibilidade de políticos atualmente sem cargo, como também de prefeitos e parlamentares em pleno exercício do mandato. A não aplicação da lei em 2010 garantiu a eleição de inúmeros candidatos fichas sujas, que continuarão nos cargos, gerando situações incongruentes no cenário político. O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), considera que esse "contrassenso" seria evitado se o STF tivesse definido que a lei não atinge casos anteriores a sua edição.
Não são poucos os exemplos de políticos que hoje não podem disputar eleição por serem "fichas sujas". Destacam-se nessa situação os deputados João Pizzolatti (PP-SC) e Natan Donadon (PMDB-RO), além dos prefeitos das cidades de João Alfredo (PE), Severino Cavalcanti (PP), e de Jandaia do Sul (PR), José Borba (PP). O senador Cássio Cunha Lima (PSDB-PB) também estaria impedido de se candidatar, segundo interpretação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) de 2010, embora ele negue estar inelegível.
Para Marco Aurélio, não faz sentido um sistema em que o político perde o direito de se candidatar, mas não o de exercer o mandato. "Com essa retroação (da Lei da Ficha Limpa) consagrada pelo Supremo, passa a haver um sistema capenga. Alguém ocupa uma cadeira no Congresso, mesmo estando inelegível. Isso é um contrassenso, porque inelegibilidade nada mais é do que a suspensão parcial dos direitos políticos", avalia o ministro.
O advogado eleitoral José Eduardo Alckmin discorda que a lei seja incongruente. "Quem está no exercício já obteve do eleitorado uma manifestação favorável de que é a pessoa indicada para o mandato", destaca. O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, concorda com a tese da contradição. "Mas não vejo como retirá-lo do mandato porque, se a lei não estava em vigor na ocasião da eleição, não pode atingir político com mandato em curso."
Pelo cenário atual, Severino Cavalcanti ficará impedido de concorrer à reeleição. Ele renunciou ao cargo de deputado em 2005 para escapar da cassação. O pepista está inelegível por oito anos contados de 2007, quando terminaria o mandato. Não pode se candidatar até 2015.
Candidatos
Quadro semelhante é o de Borba, que também pretende disputar a reeleição. Ele renunciou ao mandato de deputado em 2005, após ser envolvido no escândalo do mensalão. Outro atingido pela Ficha Limpa, o deputado João ficará inelegível até 2015. O mandato atual, no entanto, está a salvo. O advogado Michel Saliba diz que trabalha para derrubar na Justiça a condenação de Pizzolatti, que não irá concorrer em 2012, mas deve se candidatar daqui a dois anos. Severino e Borba não retornaram as ligações da reportagem.
O senador Cássio Cunha Lima ficaria inelegível até 2014, uma vez que teve o mandato de governador cassado por irregularidades nas eleições de 2006. O tucano entende que não está inelegível, uma vez que já cumpriu o afastamento de três anos previsto na lei anterior. "É inadmissível imaginar que alguém possa ser punido duas vezes pela mesma razão. Isso fere qualquer garantia de direitos individuais", destacou. Ele não pretende concorrer até 2018, quando termina o mandato de senador.
Justiça prorroga acordo de Silvinho
O ministro Joaquim Barbosa, relator do processo do mensalão no Supremo, prorrogou por três meses o período em que o ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira, o Silvinho, terá que comparecer à Justiça para cumprir o acordo de delação premiada e não ser julgado por formação de quadrilha na ação do mensalão. A decisão de Barbosa atende a um pedido do procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Silvinho não cumpriu integralmente o acordo de comparecer mensalmente ao cartório da 2ª Vara Criminal de São Paulo. Ele não teria justificado as ausências nem prestado as 750 horas de serviço comunitário, determinadas no acordo com o Ministério Público.

Autor(es): » DIEGO ABREU
Correio Braziliense - 25/02/2012

Comentários