Ponto de interrogação







Quando inventaram a filosofia e todas as ciências desse mundo; quando criaram os deuses e o homem passou a acreditar na existência de um ser superior; quando descobriram que além deste universo existiam outros universos com bilhões de galáxias e trilhões de estrelas, ninguém disse que dentro do ser humano existiam sentimentos bons e que acima de todas as ciências existia a vontade de ser.


Ninguém falou do medo do escuro, não disseram dessa vontade de existir para sempre, não falaram dos nossos ossos fracos, nem das mentes deformadas que apagaria a luz interior. 


Em algum lugar, por algum motivo o ser humano se perdeu em meio à multidão e organizou a sociedade. E todos quiseram ser donos de tudo e todos quiseram dar ordens e ninguém quis obedecer. Criou-se, então, uma fantástica mistura de patrões e empregados, de maridos e esposas, de pais e filhos e se fizeram as leis. Com isso nasceu a maledicência, o preconceito, a violência e as almas ficaram sozinhas. Nesse beco escuro de alegrias e tormentos todo mundo quis tomar o sorriso de alguém e, por isso, apenas por isso, passamos a acreditar na ilusão da eternidade, passamos a perguntar por nossas origens, de onde viemos e o que, afinal de contas, estamos fazendo aqui.


Era um universo e o ser humano, capaz de raciocinar, não entendeu e que a vida não era apenas uma novela de época e que cada um deles haveria de pagar bem caro pela história da humanidade. O mundo se transformou num maldito ponto de interrogação, num conglomerado de pessoas querendo humilhar outras pessoas e ter o direito de também ser Deus. Dormiram todos e sonharam com um paraíso particular em que todos eram felizes e o mal, as dores não existiam.


Os sociólogos falaram de igualdade, os antropólogos disseram que existir era apenas um susto e as religiões explicaram que voltaríamos a viver outra vez. E tudo se dividiu entre certo e errado e o homem, criatura divina, aprendeu a matar. A culpa, a máxima culpa pelas guerras, pelas atrocidades não era mais nossa, era da solidão e das ciências sociais.


Assim, entre milhões de universos e bilhões de estrelas descobrimos que o ser humano não passa de poeira cósmica e que todos os livros, todas as teorias são inúteis para aqueles que querem fazer o bem. E o mal venceu. No universo em que só existiam deuses passaram a existir demônios e a sociedade decaiu, chegando ao extremo de criar a escravidão. E com a ideia da escravidão veio a ideia da liberdade. E depois da liberdade, o mundo se transformou num grande e inexplicável ponto de interrogação.


Editorial do Jornal Pequeno 27-07-2012

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