O lixo, onde começar - COLUNA DO SARNEY


São Luís não tem primado pela limpeza, tornou-se uma cidade suja. Os que nos visitam, quando nos encontram falam das belezas da capital, seus monumentais sobrados, seus mirantes e azulejos, suas ladeiras, seu casario, seus telhados, a beleza dessas cores de ocre, que lembram as cores de Lisboa, mais precisamente da Alfama. Mas lamentam a sujeira da cidade. Já nos acomodamos tanto com ela que já não choca e até ficamos complacentes. Mas enquanto formos uma cidade suja, somos vulneráveis ao turismo e à saúde. Até inventaram uma difamação para a água, como imprópria para o banho, e espantamos o povo das praias, quando na verdade a sujeira estava na terra.

Há muitos anos, eu conversava na ONU (1961) com o grande escritor Gilberto Amado, de quem me tornei amigo, sobre os grandes estadistas do mundo. Chegamos à conclusão de que era Júlio César, pelo Império que tinha construído, a visão de estado, guerreiro, herói e intelectual, estrategista e tribuno. Para coroar, seu fim trágico no Senado romano. Mas acrescentei que ele tinha começado sua carreira e sua fama com a limpeza da cidade de Roma, que era uma cidade imunda, com odor de podridão no ar. Júlio César declarou guerra ao lixo e dedicou sua atenção a torná-la uma cidade diferente, sem podridão. Foi o primeiro passo para tornar-se o político popular e construir sua grande e extraordinária carreira.

É um exemplo que estou dando e nos ensina que as pequenas coisas também são importantes, embora não seja questão de estado, é questão de administração.

São Luís nunca teve a noção exata e precisa do que é um prefeito. Suas funções se confundem com a de realizar-se em adversário do governo estadual e gastar todo o mandato em confrontar o governador. A população, então, cobra do governador as obras que são da responsabilidade do prefeito e este se sente confortável para esquecer que a função de cuidar da cidade é do Município e não do Estado. O resultado é que as grandes obras de São Luís foram feitas pelo Estado. Eu, pelo menos, quando fui governador, expandi a cidade. Com a ponte de São Francisco criei uma nova cidade do outro lado, hoje, com cerca de 300.000 habitantes, onde se localizam os arranha-céus, abertura para as praias. Melhorou a qualidade de vida da população.

A Barragem do Bacanga criou uma outra cidade, abrindo o acesso ao Porto do Itaqui, e ali foram implantadas as grandes indústrias, a universidade e novos bairros, como o Anjo da Guarda, Fumacê, Vila Nova. Depois a construção das grandes avenidas, os anéis rodoviários, a Avenida Kennedy e dos Franceses, as primeiras que deram respiração à pressão de expansão da cidade. O efeito correlato e mais importante foi o de salvar a cidade velha da destruição, que já tinha começado com a derrubada de quarteirões de velhos sobrados, para abrir a Magalhães de Almeida e a Rua do Egito. Mais recentemente, os viadutos construídos por Roseana muito ajudaram a circulação de veículos e pessoas.

Assim, um novo prefeito, também que pretende mudar, deve começar com o lixo da cidade, que está imunda. Limpar, não somente o Centro visível, mas os bairros. Ao prefeito compete cuidar da educação básica, das escolas, crianças, que merecem nossa melhor atenção e respeito; tratar do trânsito, da saúde emergencial, dos primeiros socorros; do tráfego, do ordenamento das regras de tráfego e dos centros de saúde dos bairros. Há uma reclamação violenta, dizendo que nada disso funciona, que é uma calamidade total.

Mas, em nossa cidade, a política se tornou tão primária que basta ver a discussão que se faz se prefeito e governador devem trabalhar em conjunto. A democracia é feita da escolha em eleições dos governantes. A luta é natural, as divergências e os lados também. Mas, passada a eleição, os eleitos devem trabalhar em conjunto pelo bem da população, sem que isto signifique abdicação de pontos de vista ou de independência. Isso é que é ser moderno, é renovar métodos e comportamentos. Eu, quando vejo essa discussão, fico estarrecido. E eu é que sou o velho!

O prefeito que entra não tem nada a ver com o passado, mas tem tudo com o futuro. Todos amamos a cidade. Vamos trabalhar juntos sem politicalha, sem rixas pessoais. E é justo que tenhamos sugestões legítimas a dar. São Luís precisa de um Plano Diretor para valer, para identificar os problemas do presente e prevenir erros no futuro. Ordenar o crescimento. O que tem aí ainda é do tempo de Fialho e de Haroldo.

Mas, como grande tarefa, de início, limpar a cidade. É tarefa não só da Prefeitura, mas de criar também na população, que está mal acostumada, educação ambiental para não sujar, implantar a cultura da limpeza e que esta tarefa é de todos e de cada um.

É pouco? É. Mas retornemos ao exemplo de Júlio César em Roma. São Luís merece.

COLUNA DO SARNEY
06/01/2013

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