quarta-feira, 30 de setembro de 2015

Estudo revela que adolescentes estão sendo mortos antes de cumprirem medida socioeducativa

Numero de adolescentes mortos antes de cumprirem medida socioeducativa revela impotência do sistema socioeducativo no Estado




Os adolescentes em conflito com a lei, por estarem inseridos num universo de violência, estão num nível elevado de vulnerabilidade, vivenciando violações sejam como algozes da violência ou vítimas dela. Sob esse aspecto, o que vem ocorrendo ao longo dos anos é a elevação das taxas de homicídio contra adolescentes e jovens.

Estudo elaborado pela 2ª Vara da Infância e Juventude de São Luís (2ª VIJ) - competente para apurar a prática de atos infracionais cometidos por adolescentes, monitorar e fiscalizar a execução das medidas socioeducativas em meio aberto e fechado – revela que 29 jovens que respondiam a processo foram vítimas de homicídio antes da apuração do crime ou cumprimento de medida socioeducativa. O número corresponde a 4% do total dos adolescentes (717) que figuravam em 910 ações judiciais referentes a autos de apuração, execução e procedimentos policiais.

De acordo com o documento “Justiça Juvenil em 2014: atos infracionais, medidas socioeducativas e óbitos, concluído a partir da análise de processos distribuídos na 2ª VIJ no ano de 2014, a maioria dos adolescentes assassinados são do sexo masculino, afrodescendentes e morreram vítimas de causas externas, exclusivamente por homicídio.

O estudo apresenta, ainda, dados estatísticos sobre as ações que envolvem adolescentes em conflito com a lei, avaliando a execução de medidas socioeducativas de responsabilidade da vara, para responder às demandas.

Para o juiz titular da 2ª Vara da Infância e Juventude, José Santos Costa, o estudo tem o propósito de servir de fonte documental, que leve a uma reflexão por parte das autoridades e da sociedade quanto ao perfil, à atual situação dos adolescentes e do real alcance da Justiça.

"A sistematização dessas informações permitirá ações de enfrentamento diretas e efetivas, proporcionando melhorias no sistema de atendimento socioeducativo, como já vem ocorrendo internamente na 2ª VIJ,” enfatiza o juiz.

NÚMEROS - O relatório mostra que foram distribuídos 1.493 processos à vara, sendo a maior parte (910) referente a autos de apuração, execução e procedimentos policiais (60,95%); 433 (29%) tramitações no Ministério Público e outros relativos a cartas precatórias, petições diversas e distribuições canceladas.

Nos 910 autos, figuram 717 adolescentes, já que em alguns casos um mesmo jovem responde por mais de uma ação judicial. Desse universo, pouco mais de 50% tiveram sua primeira passagem pela Justiça.

Em relação às decisões ou sentenças proferidas, para a maioria deles foram determinadas medidas socioeducativas (63,73%); em seguida, arquivamentos requeridos pelo Ministério Público (25,10%), nas seguintes situações que impedem a conclusão do processo: quando não há elementos suficientes para deflagrar a ação; quando o adolescente atingiu a maioridade; quando não foi possível localizá-lo ou, ainda, estavam ameaçados de morte, no decorrer do processo, e chegaram a óbito.

Dentre as principais medidas socioeducativas, há prevalência pelas realizadas em meio aberto. A liberdade assistida (160) e a advertência (156) foram as mais aplicadas, correspondendo a 35,01% e 34,13%, respectivamente. As demais foram internação (58 - 12,70%), prestação de serviço à comunidade (56 – 12,25%), semiliberdade (21 - 4,60%) e obrigação de reparar o dano (6 – 1,31%).

A pesquisa constata que a advertência – aplicada na maioria das vezes durante a audiência - foi a medida que apresentou o melhor índice de cumprimento pelos jovens. Já a liberdade assistida foi a mais aplicada, porém com alto índice de descumprimento e de reincidência/ reiteração.

Identificam-se 177 adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa em meio aberto, sendo 51 em prestação de serviço à comunidade e 126 em liberdade assistida.

Os resultados apontam que a maioria dos adolescentes é do gênero masculino. Em relação à faixa etária, a idade entre 17 e 18 anos possui uma maior concentração de adolescentes e jovens cumprindo medidas socioeducativas em meio aberto.

No que diz respeito aos atos infracionais praticados pelos adolescentes, o roubo é o mais frequente com 67,23%, seguido pelo tráfico de drogas (10,17%), associação criminosa (5,08%), homicídio (3,96%) e lesão corporal (3,96%).

PROJETOS - Diante das dificuldades apresentadas, a 2ª VIJ, no início de 2015, implantou o Projeto Eficiência, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que visa garantir agilidade e qualidade à prestação dos serviços jurisdicionais, oferecendo um plano prático de gestão, com orientações aos magistrados e gestores, capacitação de servidores e implantação de organização cartorária, método e rotina de trabalho de forma racionalizada, padronizada e equilibrada.

Para potencializar a execução das medidas socioeducativas, a unidade judicial implementou, em março de 2015, o projeto piloto “Monitoramento e fiscalização das medidas socioeducativas em meio aberto” que visa, dentre outras ações, a criação de um banco de dados atualizado mensalmente e a elaboração de um diagnóstico acerca dessas medidas.

Seguindo o que é preconizado pelas diretrizes que regem os direitos da criança e dos adolescentes autores de ato infracional, o juiz da 2ª Vara da Infância tem priorizado a aplicação de medidas não restritivas de liberdade como a advertência, liberdade assistida e prestação de serviço à comunidade.

“A 2ª VIJ vem se preocupando, também, em sistematizar informações acerca dos adolescentes ameaçados de morte e a notificação compulsória aos órgãos responsáveis em apurar os casos em que os adolescentes relatam tortura praticada por policiais civis e militares, no momento da apreensão dos mesmos, de forma que as providências legais sejam tomadas, conforme cada caso e, assim, contribuir para reduzir os abusos e desrespeito aos direitos desses adolescentes”, informa o magistrado.

Para José Costa, essas causas poderiam ser evitadas se existissem investimento em políticas públicas básicas, de redução da violência letal e a implantação do Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAM) - criado pelo governo federal, em 2003, e instituído oficialmente, em 2007, através do Decreto nº 6.231.

Por meio da pesquisa, foi possível verificar situações que prejudicaram a finalização do processo da forma esperada, ou seja, por meio de absolvição ou determinação de uma medida socioeducativa. As principais causas foram: quando adolescentes completaram a maioridade, não foram localizados ou, ainda, que estavam ameaçados de morte e chegaram a óbito.

Os dados foram apurados por uma equipe formada pelo juiz, secretária judicial, assessora judicial, assistente social, psicóloga, estagiárias de Serviço Social e Psicologia. Os dados foram organizados pelas servidoras Ana Letícia Barbosa Lima (psicóloga) e Maria Betânia Silva Magalhães (assistente social).

A metodologia utilizada na pesquisa foi de base quantitativa, através dos dados registrados no sistema Themis PG, de informações obtidas a partir dos processos distribuídos em 2014, e dos relatórios produzidos pelas instituições executoras das medidas socioeducativas referentes a processos oriundos de 2014 e anos anteriores.

A assistente social Maria Betânia Silva ressalta que o estudo aponta para uma impotência do sistema socioeducativo no Estado, situação que segundo ela, pode ser amenizada por meio de um trabalho preventivo e de uma articulação em rede.

“Os adolescentes em conflito com a lei, por estarem inseridos num universo de violência, estão num nível elevado de vulnerabilidade, vivenciando violações sejam como algozes da violência ou vítimas dela. Sob esse aspecto, o que vem ocorrendo ao longo dos anos é a elevação das taxas de homicídio contra adolescentes e jovens”, pontua a assistente social.

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