O parlamento e a crise



Foto: Rodolfo Stuckert

*Hildo Rocha

Enfrentar uma crise política e econômica tão severa quanto a atual exige um esforço conjunto e harmônico. Cada instituição deve realizar seu papel, e fazê-lo com o máximo de eficiência.

Parlamentos estão entre as instituições mais importantes de um país. Sua previsão na lei maior de todas as grandes democracias deriva de doutrinas formuladas ao longo dos séculos por juristas e filósofos: a teoria da separação de poderes e a do governo misto. Não só o parlamento desempenha uma função especial, a legislativa, como tem uma legitimidade especial, por se compor de representantes de todo o povo.

E é neste último aspecto que reside a importância de um parlamento em uma situação de crise. O Poder Legislativo é aquele que reúne representantes de todas correntes políticas, oriundos de diferentes estados, homens e mulheres, trabalhadores e empresários. Se algum órgão da República tem a capacidade de formular e aprovar uma grande estratégia para o País, esse órgão é o parlamento.

Dito de outra forma: a superação da crise exige o protagonismo do Poder Legislativo. Já desde há alguns anos esse ideal vem sendo difundido. O parlamento não pode se ver limitado a um órgão que referenda ou não as decisões do governo. Ao contrário, ele tem que propor, criar, inovar, ter ideias para desatar os nós do País. Isso não é diminuir a capacidade do Poder Executivo, mas apenas reconhecer a nossa própria: o Congresso brasileiro reúne, na Câmara e no Senado, quase seiscentas cabeças devotadas a encontrar soluções para o País.

É por isso que tem razão quem diz que a crise pode ser uma oportunidade para nossas instituições avançarem. Se as agruras por que passa o País servirem para despertar as melhores potencialidades deste Congresso, teremos conseguido um avanço duradouro.

E isso parece já estar acontecendo. As propostas são cada vez mais focadas nos assuntos mais prementes. A Agenda Brasil, apresentada ano passado pelo Presidente do Senado Renan Calheiros, é um exemplo. Reformas sérias estão em discussão — eu mesmo tenho orgulho de presidir a Comissão Especial da Reforma Tributária. E temas espinhosos como a reforma política ou a questão da maioridade penal finalmente avançaram.

Tudo isso significa que o Congresso está entrando em maior sintonia com a sociedade, o que é muitíssimo positivo. Entrar em sintonia não significa que todos os congressistas comecem a pensar igual, pois a própria sociedade não tem pensamento uniforme. Significa, isto sim, atacar os problemas que importam de verdade aos cidadãos. Pode haver discordância quanto ao modo certo de melhorar a educação, por exemplo — mas todos precisam reconhecer que o brasileiro está insatisfeito e quer uma educação pública de melhor qualidade.

O cidadão brasileiro também merece crédito por esse avanço institucional. Sua disposição crescente a envolver-se com a política, a protestar, a fazer chegar aos representantes os seus sentimentos e sua visão de mundo foram essenciais para aproximar o parlamento do povo.

A adversidade testa o País, mas ele está passando no teste. O Congresso, ambiente por excelência do diálogo na democracia, encontrará o caminho para trazer de volta a harmonia e a prosperidade.

Não custa lembrar: mais de dois milênios atrás, uma república esteve muitíssimo mais em crise do que a nossa. No início da Segunda Guerra Púnica, Roma esteve prestes a ser destruída. Aníbal impôs aos romanos sucessivas derrotas, e, após a batalha de Canas, Roma parecia fadada a cair nas mãos dos cartagineses. Em vez disso, o que aconteceu foi a maior virada de toda a história: Roma não só venceu Cartago, como submeteu todo o mundo conhecido. E como isso aconteceu? Na opinião do historiador grego Políbio, a explicação estava precisamente nas instituições de Roma: os cônsules, o Senado e o povo juntos fizeram a República superar a maior das crises.

A nossa República também vencerá graças às instituições.

*Hildo Rocha é deputado federal pelo PMDB, e Presidente da Comissão Especial da Reforma Tributária na Câmara dos Deputados.

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