A revolta contra o crime de vilipendio de cadáver e a reação da mídia






Não é de hoje que jornais impressos, telejornais e portais de noticias tradicionais e influentes, alguns com décadas de historia no jornalismo e com alto poder econômico e político publicam e veiculam imagens de corpos vitimas de acidentes, assassinatos e suicídios, indiferentes a causa da morte, tais veículos preocupam se apenas com a tiragem, audiência ou números de acessos.  

Tal pratica sempre foi criticada e combatida, porém nos últimos anos vem crescendo o numero de pessoas indignadas que passaram a repudiar e  criticar o ato considerado por muitos como crime de vilipendio de cadáver tipificado no artigo 212 do Código Penal Brasileiro.

Com o advento dos blogues e a popularização das redes sociais este tipo de ação tornou-se uma febre, a divulgação e compartilhamento deste tipo de imagens proliferaram de forma assustadora e incontrolável, o que claro, fez aumentar também as criticas e protestos contra quem age  de tal forma.

Nesta quarta-feira ( 22), a divulgação das imagens do corpo de uma jovem que caiu da torre de um edifício residencial em São Luís e a forma como foi noticiada a morte da garota causou imediata reação entre professores de jornalismo, jornalistas, radialistas e blogueiros.


As criticas se avolumaram e tomaram conta das redes sociais, a forte manifestação resultou em duas notas de repúdio assinadas por dezenas de profissionais de imprensa e vários textos publicados em blogues e outras redes sociais condenando a divulgação das imagens. Por outro lado houve quem questionasse e criticasse as notas, textos e manifestações de protesto, outros preferiram usar os blogueiros com bode expiatório e teve até quem usou o caso para ofender e atacar os blogueiros.   


A crackosfera reagiu à conclamação feita por muitos colegas comunicadores à reflexão sobre a necessidade de se elevar padrão ético.Que coisa




Reproduzimos abaixo alguns textos sobre o caso




Jacqueline Heluy



Parem, nobres colegas!


Parem por apenas dois, cinco, dez segundos antes de postar em seus blogs, sites, páginas ou seja lá o que for, imagens de pessoas mortas, qualquer que seja a circunstância. 

Parem e pensem que o que está ali naquele chão, inerte e desfigurado, não é apenas um corpo sem dono. É um ser que, mesmo sem vida, é humano.

Pensem na dor dos que choram essa partida.

Pensem no sofrimento da mãe que gestou, pariu, amamentou, acalentou, adormeceu, acariciou...e que agora sofre.

Pensem que neste momento a única vontade desta mãe é querer recolher a filha do chão, na tentativa de empurrá-la de volta ao seu ventre, a fim de protegê-la de tudo e de todos, inclusive dos ‘abutres’ que tentam alimentar-se de sua morte.

Mas, se não quiserem dar um basta nessa prática odienta (e sei que não vão), pelo menos tenham consciência de que um dia pode ser um dos seus filhos estendido no chão. E tenham a certeza que assim como vocês fizeram, outros 'abutres' também não vos pouparão!

Lissandra Leite

Semana passada, a querida XXXXX me chamou por inbox pra conversar. Ela estava incomodada com a profusão de fotos de pessoas vítimas de mortes violentas nos blogs da cidade. Naqueles dia, uma em especial nos chocou: a de um menininho atropelado. Conversamos sobre a possibilidade de puxarmos um debate público sobre o tema, tentando evitar que mais famílias fossem desrespeitadas por essa prática que a XXX chamou de "sem noção, irresponsável".

Não tivemos tempo, não é minha amiga? 

Hoje, quando a XXXX, filha da XXXX, nos deixou, mais uma vez os absurdos se repetiram em blogs que se dizem jornalísticos e nas timelines das redes sociais... 

Meus amigos, chega disso! Respeitem a dor alheia, seja de quem for! Não chegaremos a lugar nenhum, como sociedade, se não conseguirmos nos colocar no lugar do outro. Chega de publicar essas fotos dolorosas. Chega de compartilhar essas imagens. 

Isso NÃO é liberdade de expressão, isso NÃO é informação. Isso é desrespeito e falta de humanidade. 

Hoje, todo nosso amor vai pra XXXXX. Tudo o que podemos fazer é isso: abraça-la, acolhê-la, mesmo sabendo como é limitada nossa capacidade de ajudar, diante de tanta dor. Mas, aproveitando a solidariedade que aflorou entre os colegas jornalistas, peço algo mais: uma reflexão ética sobre nossas práticas. Uma mudança real.

Roberta Gomes
É claro e nítido que aqui no Maranhão o tal jornalismo feito em blogs está longe de ser JORNALISMO. Não existe padrão de emissoras para não divulgar suicídios.Desde que comecei a estudar Jornalismo sempre soube que existe um PADRÃO JORNALÍSTICO de que não divulgamos suicídio em nenhuma circunstância. 

Mas o que estamos vendo é um total descompromisso, não apenas com o jornalismo (muitos não são e os que são estão esquecendo do que aprenderam), mas com a vida, com o sentimento do outro, com a humanidade. 
Além de noticiar, estampar fotos. É absurdo, enojante, desrespeitoso no mais alto grau. 

São ações como esta que deixa às claras: não há compromisso com o fazer jornalístico, não há compromisso com a função social que o jornalismo deve ter, não há compromisso com nada.

Portanto, como dar credibilidade a páginas, sites, blogs (como quiserem chamar) que prestam um desserviço à sociedade e que não têm qualquer sinal de respeito por ninguém?!

De há muito queria externar meu descontento, para ser mais branda, com esse tipo de prática, pautada na irresponsabilidade. 

Hoje, especificamente hoje, quando temos uma situação delicada que envolve uma colega jornalista, temos mais exemplos dessa falta de humanidade e desrespeito. E não venham dizer que se soubessem que era jornalista, não teriam feito, porque o mesmo deveria ocorrer com qualquer pessoa, sendo jornalista ou não.

Infelizmente, alimenta-se em um mundinho de muito dinheiro e poder esse círculo vicioso. E assim vemos o nosso jornalismo agonizar, muitas vezes morrendo, muitas vezes suicidando-se.


O crime de vilipendio de cadáver 

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