A interdição de delegacias de polícia no Maranhão realça o fosso entre a propaganda e a realidade

"A Delegacia de Polícia de Governador Nunes Freire há anos vem sendo modelo de violação de direitos humanos" promotora de justiça Laura Amélia Barbosa 

Duas delegacias de polícia civil foram alvo de medidas judiciais de interdição nos últimos dias no Maranhão, a decisão atende solicitação do destemido Ministério Público do Maranhão que após vistorias constatou o estado precário e insalubre dos locais, não restando outra iniciativa a não ser pedir a interdição. 

Parece contraditório que o governo do estado tenha recursos para invistir forte em propaganda - segundo o Portal da Transparência do governo do Maranhão, somente em 2016, a Secretaria de Comunicação do Estado empenhou um total de R$ 91.950.417,16 (noventa e um milhões, novecentos e cinquenta mil, quatrocentos e dezessete reais e dezesseis centavos). -  e não tenha condições de pelo menos fazer uma simples reforma nas sucateadas delegacias do Maranhão, a questão não parece ser falta de recursos e sim de prioridade.

Recentemente o SINPOL/MA se manifestou sobre a falta de valorização da Polícia Civil:  "Governo da propaganda, da mídia, da ilusão: sentado sobre o caos, mas sorrindo para as câmeras; fingindo uma realidade que só existe no imaginário de quem se deixa iludir pelas milionárias propagandas, que só visam promover quem sonha se manter no exercício do poder."

Em outro trecho a nota denuncia a falta de estrutura minima para que o policial civil possa desempenhar sua função.  "Em meio a um cenário de guerra, onde a criminalidade se impõe como uma força paralela ao Estado, criando normas e causando terror, a Polícia Civil trabalha em meio ao caos, onde a falta de estrutura e de efetivo salta aos olhos até dos mais desatentos. Delegacias que mais parecem chiqueiros; custódia ilegal de presos nas unidades policiais do interior; inexistência de programas de educação e treinamento continuados para seus profissionais; administrativos emprestados de prefeituras, trabalhando na clandestinidade da justiça trabalhista." SINPOL/MA

O QUE DIZ O MPMA SOBRE A DEPOL DE BARÃO DE GRAJAÚ 

A Delegacia de Polícia de Barão de Grajaú é um ambiente insalubre, com instalações elétricas e hidráulico-sanitárias totalmente comprometidas. A iluminação e ventilação das celas não é adequada, as fossas sépticas estão quebradas e as caixas de esgoto abertas. Também não há espaço para banho de sol dos presos.

Além disso, a segurança do local é mínima, com registro de diversas tentativas de fuga. O prédio não conta, sequer, com muro, o que permite a entrada de drogas e outros objetos pelas grades de ventilação das celas.

Embora conte com cinco celas e abrigue 37 presos, a Delegacia não conta com um carcereiro. Dessa forma, um investigador de Polícia Civil precisa assumir essa função, diminuindo ainda mais o efetivo atuando na apuração de crimes. Também não há celas específicas para mulheres, menores de 18 anos e presos do regime semiaberto.

O fato da Delegacia de Polícia abrigar presos condenados no mesmo espaço de detentos provisórios também afronta diretamente a Lei de Execuções Penais.

DECISÃO DA JUSTIÇA

Com base em uma ação proposta, em 4 de abril, pela Promotoria de Justiça da Comarca de Barão de Grajaú, a Justiça determinou, em 26 de abril, a imediata transferência de todos os presos com condenação definitiva em regime fechado da Delegacia de Polícia Civil de Barão de Grajaú para penitenciárias do estado. O prazo é de 10 dias após a notificação do Estado do Maranhão, o que ainda não aconteceu.

O Estado também deverá se abster de transferir ou manter condenados definitivos na carceragem. Nos dois casos, o descumprimento da decisão sujeitará o Estado ao pagamento de multa diária de R$ 500.

Na Liminar, assinada pelo juiz David Mourão Guimarães de Morais Meneses, também foi determinado prazo de 120 dias para que seja reformado o prédio em que atualmente funciona a Delegacia de Polícia Civil de Barão de Grajaú, que deverá passar a funcionar somente como Cadeia Pública. No mesmo prazo, a Delegacia de Polícia deverá ser transferida para outro prédio, próprio ou alugado. No caso de descumprimento desses itens da decisão, está prevista a aplicação de multa de R$ 1 mil.



O CAOS EM GOVERNADOR NUNES FREIRE 

A Delegacia de Polícia do município de Governador Nunes Freire funciona em um prédio cedido pela prefeitura e possui aspecto de abandono. Na área da carceragem, 39 presos estão distribuídos em três celas. A outra cela existente no prédio está desativada, porque foi depredada durante uma rebelião ocorrida em 3 de dezembro do ano passado, quando quatro detentos fugiram.

As celas são quase totalmente escuras, com uma pequena abertura para a ventilação e entrada de luz. Os presos reclamam também de falta de higienização do local, inexistência de espaços para banho de sol e ausência de atendimento médico e odontológico adequado. 

Em uma das vistorias realizadas pelo MPMA foi flagrado um preso com tuberculose junto a mais 13, em uma cela escura e insalubre. Outro detento de 74 anos, com problemas de saúde, estava misturado aos demais

há anos vem sendo modelo de violação de direitos humanos, devido à estrutura física do local não atender o mínimo dos direitos dos presos. “No local, existe superlotação e o ambiente é insalubre, o que contribui para o estado de inquietação dos presos”, afirmou, na ação, a promotora de justiça Laura Amélia Barbosa.


DECISÃO DA JUSTIÇA 

Atendendo à solicitação do Ministério Público do Maranhão, feita em Ação Civil Pública, proposta em 18 de maio, a Justiça determinou a interdição completa da cadeia pública de Governador Nunes Freire, localizada na Delegacia de Polícia.

A manifestação ministerial foi ajuizada pela promotora de justiça Laura Amélia Barbosa contra o Estado do Maranhão. A decisão foi proferida pelo juiz Aurimar Andrade Arrais Sobrinho, no dia 24 de maio.

Também foi ordenada a transferência dos presos que se encontram na cadeia de Governador Nunes Freire, no prazo máximo de cinco dias, para a Penitenciária Regional de Pinheiro.

Igualmente ficou decidido que as secretarias de Estado de Administração Penitenciária (Sejap) e de Segurança Pública (SSP) devem designar também novo local para os presos provisórios.

O Estado do Maranhão está, ainda, obrigado a apresentar, no prazo de 30 dias, cronograma de reforma da delegacia de Governador Nunes Freire, para a adequação da unidade às normas vigentes.

Em caso de descumprimento injustificado, total ou parcial, de qualquer um dos itens, foi estabelecido o pagamento de multa no valor de R$ 10 mil.

Anteriormente, foi firmado Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Estado do Maranhão, com o objetivo de transformar o atual prédio da Delegacia de Polícia em Unidade Prisional. Porém, apenas uma das cláusulas do acordo foi cumprida. Na manifestação, a representante do MPMA esclarece que a ação não tem o objetivo de executar o TAC, mas sim de interditar a carceragem. “A finalidade é assegurar a integridade física e mental dos presos, proporcionando condições mínimas a estes”.

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