Os homens maus são todos de direita



Por *Abdon Marinho



NESTES dias em que se celebra o cinquentenário da morte de Martin Luther King Júnior, lembrei-me daquela sua frase: “O que me preocupa não é nem o grito dos corruptos, dos violentos, dos desonestos, dos sem caráter, dos sem ética... O que me preocupa é o silêncio dos bons”.

Vivemos tempos em que a bondade tornou-se monopólio de uns poucos o que nos leva a sentir falta dos verdadeiros homens bons. 

Para estes – homens “bons” da atualidade – a bondade, o mérito é aquilo que pratica um determinado seguimento da politica autodenominado de “esquerda” enquanto que a maldade – toda ela – é o que pratica o restante da humanidade a quem chamam de “direita”, “fascistas”, “retrógrados”, etc.

Este é um fenômeno mundial, que no Brasil ganha contornos bisonhos, senão vejamos:

Por estes dias a ilha-prisão do Caribe, Cuba, escolheu, indiretamente, seu terceiro “presidente”, em quase sessenta anos, 59, para ser preciso e, talvez para comemorar o fato, o novo governo iniciou prendendo alguns opositores, os poucos que ainda têm a ousadia de discordarem do regime, desta vez as prisões politicas se voltaram contra o grupo chamado “Damas de Branco”, coletivo de mulheres que protestam contra as prisões políticas de seus maridos, filhos, parentes…

Com as últimas prisões já passam de oitenta o número de presos políticos do regime comunista. 

Estranhamente, não se ouviu – e não se ouve – uma voz das chamadas “esquerdas”, dos chamados intelectuais, dos chamados defensores dos direitos humanos, protestando contra estas prisões ou pelos demais presos políticos, presos por discordarem do regime, por exercerem o seu direito de fazer oposição, presos de opinião. 

O mesmo comportamento, ou seja, o mais absoluto silêncio destes grupelhos, ocorre em relação à ditadura venezuelana, responsável pela liquidação econômica do país o que já levou, nos últimos anos milhões de cidadãos a deixarem o país e que, a agudeza da fome, leva os que ainda conseguem andar, a cruzarem a fronteira rumo ao Brasil ou à Colômbia em busca de algo tão singelo quanto um prato de comida, um medicamento, um mínimo de esperança.

Sobre isso o silêncio dos “homens bons”.

Este é o mesmo silêncio que se deu – e ainda se dar –, em relação à consolidação da ditadura na nação vizinha, com o encarceramento de opositores, prisões arbitrárias, e sem formação de culpa, de qualquer um que ousasse ou ouse discordar do regime.

Nos próximos dias ocorrerão – conforme previsto – eleições presidenciais sem a participação dos opositores do regime, por estarem presos, proibidos de disputarem ou por terem sido pegos de surpresa com uma eleição marcada no tempo e conforme a conveniência do aprendiz de ditador, Nicolás Maduro.

Palmas para a ditadura que para consolidar a “revolução” mata de fome os cidadãos.

Tudo isso acontecendo e não ouvimos um protestos dos nossos campeões das liberdades, dos direitos humanos, pelo contrário, o que ouvimos destes são saudações a estes regimes e ditadores – e aos demais, como fizeram recentemente em relação à Coreia do Norte.

Faço estas considerações para mostrar o quão contraditório tem sido o comportamento destas pessoas, destes intelectuais, destas forças políticas que pregam a liberdade, que se dizem defensoras dos direitos humanos. 

E, enquanto silenciam sobre tudo isso que narrei acima ou tem um comportamento de apoio à tais modelos políticos, por aqui tratam um cidadão condenado a mais doze anos de cadeia por crimes comuns, tipificados na legislação penal, corrupção e lavagem de dinheiro, como prisioneiro político. E vão além para dizerem que uma eleição sem sua inviável candidatura é um “golpe” na democracia.

Afinal, que democracia é essa mesmo? 

Ah, entendi, então acham normal os prisioneiros políticos de Cuba e da Venezuela, presos de opinião, por discordarem do regime – e nem falemos no brutal e inominável modelo norte-coreano, onde os opositores são abatidos a tiros de canhão e o poder passar de pai para filho sem contestação –, mas acham que os criminosos daqui, apanhados com a “mão na massa”, na prática de delitos diversos, são prisioneiros políticos, é isso?

Não deixa de ser algo estupefaciente, pois estas pessoas, estes intelectuais, estes segmentos, silenciam ou defendem publicamente modelos claramente criminosos que encarceram ou matam seus cidadãos pelo “delito de discordar”, mas não se constrangem em protestarem contra as prisões de criminosos comuns no nosso país, pessoas que foram presas depois de um regular processo, com todas as garantias do contraditório e da ampla defesa, previstas no ordenamento jurídico brasileiro, de todos conhecidos. 

Será que querem uma legislação penal só para eles, onde corrupção, lavagem de dinheiro, peculato, traficância de influência não sejam crimes?

 Ou será que querem uma “imunidade para roubar” por serem “homens bons”?

Confesso que não entendo estes nossos intelectuais, estes nossos "homens bons", defensores dos direitos humanos, etc., pois são pessoas, tidas por inteligentes, intelectualizadas, que não só silenciam ou aplaudem a violência na atualidade nos modelos políticos referidos acima, como, ainda hoje, têm como modelos inspiradores (com honradas exceções), os líderes mais sanguinários da história da humanidade. 

Ainda hoje saúdam Mao Tse Tung, responsável pela morte de milhões de cidadãos opositores chineses; Josef Stálin, igualmente responsável por outros milhões de mortos na antiga União Soviética e seus satélites; os Castro, responsáveis por milhares de mortes de cidadãos cubanos e que, até hoje, agora sob novo comando, mantém prisioneiros políticos nos seus porões, os últimos levados à cárcere estes dias. 

E, citamos estes, apenas para ficarmos entre os mais conhecidos no mundo ocidental, que ainda traz, dentre os ícones inspiradores desta nossa turma de “homens bons”, o médico revolucionário argentino, Ernesto ‘Che’ Guevara que, publicamente, numa sessão da Assembléia Geral das Nações Unidas confessou a existência dos famosos “paredões” onde eram fuzilados os opositores na ilha caribenha dos irmãos Castro. E, confessou com imensa satisfação, com júbilo. Grande modelo para trazerem escapando em camisetas ou boinas.

Não consigo compreender. Será que estes nossos intelectuais, defensores dos direitos humanos, acham razoável defenderem ou silenciarem diante do arbítrio, dos morticínios, dos assassinatos e encarceramento de opositores políticos, pelo “crime de discordar”? Será que em nome de uma causa, de um projeto político ou de situações pessoais, acham normal que as leis do país não se apliquem a determinados criminosos? 

Desço, por fim, para a realidade maranhense. Por aqui o mundo político divide-se politicamente, há mais de cinquenta anos, entre os aliados do Sarney e seus opositores. 

Assim, para os os nossos intelectuais, esquerdistas, defensores dos direitos humanos e o que os valham, basta se dizer anti-Sarney para que todos pecados, como num passe de mágica, desapareçam. Corruptos que começaram a roubar ainda na barriga da mãe, se opositora do ex-presidente, são anjos de candura, isentos de quaisquer pecados.

A mandinga serve também para curar os recém-convertidos, esteve com Sarney a vida toda mas passou, ainda que por conveniência, a apoiar os novos donatários do poder, para que seus pecados sumam. A mudança de lado é um elixir tabajara da honestidade.

Por estes dias tivemos dois fatos que considerei de gravidade extrema: um documento onde a polícia militar era orientada a colher dados sobre as preferências políticas dos cidadãos no interior, identificando aquelas que se opunham aos governos municipais e ao governo estadual; e, emendado nesta notícia, a confissão, da parte de policial militar preso por contrabando, de que o secretário de segurança do estado em pessoa teria tentado “convencê-lo” a implicar um deputado estadual e delegados de polícia como envolvidos na organização criminosa. 

As duas notícias que separadamente têm gravidade ímpar, quando vem juntas, uma engatada na outra, dispensa maiores digressões. Significa o “Ovo da Serpente”, o prenúncio de um estado de arbítrio, digno dos estados criminosos que já nos referimos anteriormente. 

Como aceitar como razoável que as preferências políticas dos cidadãos sejam mapeadas por quem se encontra no poder? Como achar normal que um secretário de segurança, que tem nas mãos a delegação para comandar as forças policiais, responsáveis por prisões e investigações, participe de uma trama para implicar inocentes na prática de crimes? 

São situações de inimagináveis gravidades, sem precedentes na história recente do país. Pois mesmo a ditadura que durou vinte e um anos, não ousou fazer. 

Seus arquivos, os arquivos da ditadura, constavam as fichas de opositores ao regime, mas daqueles da linha de frente, não se tem noticia de um mapeamento de opositores município a município, eleitor a eleitor, como se tentou ou se fez por estas bandas.

Não menos grave a tentativa de implicar delegados e um deputado estadual como integrantes de uma quadrilha de contrabandistas, conforme confessado pelo policial militar preso. 

O que se esperaria diante de fatos tão graves? Ora, que os ditos cidadãos de bem, intelectuais, defensores dos direitos humanos, protestassem de forma veemente, cobrassem um rigoroso procedimento investigatório por parte das autoridades. 

O que se ouve? Nada. Os “cidadãos de bem”, os intelectuais, as entidades da sociedade civil ou de direitos humanos ou entidades sindicais e mesmo partidos políticos, exceto os de oposição, parece-me que acharam normal, em pleno século vinte um, que tal situação ocorra. 

O que se ouve dizer é que o Palácio dos Leões – que disse nada ter com a história, que achava um absurdo tais fatos, que se tratava de uma flagrante ilegalidade –, trabalha no sentido de impedir uma investigação rigorosa que o caso requer. 

Logo os atuais detentores do poder que deveriam ter todo o interesse em provar que nada tiveram com o fato, conforme disseram. 

Pois é, igualmente estranho, que passada uma semana, ninguém tenha falado, do lado das autoridades, em abertura de conselho de justificação para apurar a responsabilidade dos oficiais, e caso culpados, excluí-los dos quadros da PMMA. 

Mais emblemático que isso só mesmo a investida do secretário de segurança ao discurso do deputado estadual supostamente implicado numa quadrilha de contrabandistas: — o deputado é um ventríloquo do "sarneyismo", disse o secretário. 

Está certo, os homens maus são todos de direitas e, no Maranhão, ventríloquos e discípulos de Sarney. 

Abdon Marinho é advogado.

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